Agricultura
otimizada III.
Primeiro vivíamos de
extrativismo de raízes, flores, frutas e frutos silvestres. Com algumas criações
de pequenos animais, e pequenos roçados plantados. A água vinha de rios e
riachos, grandes e pequenos, permanentes ou temporários; lagoas, barragens e
açudes naturais. A chuva tinha um poder de irrigação, sobre matas, florestas, e
as pequenas plantações. A cultura indígena nos ensinou a fazer um rodízio nas terras,
e nos tipos de plantação.
E eles chegaram com
estruturas de concreto e tubos de aço, represando rios e córregos, construindo barragens
e açudes, dizendo que assim a vida podia ser melhorada; aceitamos tudo, e não
falamos nada. Disseram que com uma plantação extensiva de um produto,
aumentariam os lucros, e diminuiriam as perdas.
Depois chegaram oferecendo
ajuda e recursos, para construir cisternas e perfurar poços artesianos, como
estratégias do combate e convivência com a seca, dizendo que assim a vida
poderia melhorar. Novamente aceitamos, assumimos dívidas em bancos, e não
falamos nada. E eles novamente voltaram trazendo sementes e fertilizantes;
construíram estradas e disseram que assim a vida ia melhorar. Acreditamos na
tecnologia e na ciência, acreditamos em suas competências, e não falamos nada.
Demos creditos ao conhecimento e assumimos os débitos em bancos e cartórios. Deixamos
nossas preces e crenças, acreditamos na ciência oferecida, uma meteorologia e
uma climatologia, associadas a uma hidrologia, que gerava conhecimentos na agronomia.
Produzimos tudo como fora indicado e ficamos sem nada.
Continuaram oferecendo novos
e melhores fertilizantes, para uma terra já fraca, explorada e saturada, e mais
as sementes geneticamente modificadas, dizendo serem melhoradas. Disseram que assim a produção podia ser planificada,
aumentada e melhorada. Aceitamos tudo, compramos os insumos, e não falamos
nada. Ofereceram diversas gestões: de plantio, de irrigação, de colheita e de
qualidade.
Derrubamos matas e florestas
para aumentar a área agrícola e plantar sementes importadas. Aramos tudo,
semeamos tudo e plantamos de tudo. Plantamos produtos agrícolas para produzir
rações para animais. Contamos com chuvas e orações, silenciosos e agradecidos
ao céu, mas aos homens de empresas como cientistas, economistas, atravessadores
e atacadistas não falamos nada.Trouxeram maquinas agrícolas para uma
agricultura mecanizada. Aceitamos, adquirimos as maquinas. Aramos e plantamos
sem dizer nada. Ensinaram-nos modelos de plantio e irrigação mecanizada,
dizendo ser um novo modelo, uma agricultura com gestão e otimizada. Sempre
plantamos para esperar e colher, e nunca falamos nada.
Depois de conhecer as plantas
por nomes populares, aprendemos a conhecer e reconhecer seus nomes científicos,
seus componentes químicos e nutricionais. Aprendemos a conhecer e selecionar, separar
e classificar. Aprendemos a descrever suas formas e tamanhos, suas famílias,
suas origens e seus climas ideais. As melhores épocas e regiões de plantio, com
modos de semear e replantar, colher e estocar. Seus modos de preparar e de
conservar.
Aprendemos a aproveitar
folhas e talos que antes eram descartadas. Seguimos técnicas e recomendações de
alimentos, sob um argumento de que a maior parte das propriedades úteis dos
alimentos, entre frutas e hortaliças, poderia estar sendo jogada fora, como
cascas, folhas e talos. Acatamos seus conhecimentos. Estudamos tudo e não
falamos nada. E diante uma prova aplicada, com perguntas e respostas, eles sempre
provavam que não sabíamos nada.
Um cozinheiro Frances que
viveu no século XIX (Brillat-Savarin, 1755-1826) fez uma previsão que o destino
das nações dependeria daquilo, e de como as pessoas se alimentam. Durante anos
aceitamos opiniões de como plantar e como colher, usando critérios de fertilizantes
e sementes ofertadas. Seguimos a risco uma orientação de cultura pesquisada. E
aprendemos a comer talos, folhas, cascas e sementes que antes eram desprezadas.
Como também aprendemos a consumir e ingerir, suplementos alimentares
sintetizados.
Plantamos com ajuda de
santos e das chuvas, em terras sempre despreparadas. Com sementes fracas e ressecadas.
Agora eles voltam dizendo como devemos consumir a nossa água; como usar e economizar
a água. E agora mesmo com sede e com fome não podemos dizer mais nada. Com
tecnologia, com uma agricultura toda mecanizada e conectada, as terras sempre estão
despreparadas. Com insumos agrícolas, sementes e adubos importados, até agora apenas
plantamos tentando colher os frutos no futuro. Fazemos tudo que nos dizem como
fazer, e não podemos falar nada.
Com indústrias agrícolas
multinacionais torna-se fácil analisar pelas vendas de sementes e fertilizantes
a área plantada, e tipos de culturas que foram preparadas. Com maquinas
agrícolas computadorizadas, trabalhando dia e noite, durante as colheitas conectadas
à satélites, tona-se fácil avaliar a quantidade coletada e produzida; e a
quantidade de colheita armazenada. Com os dados coletados e lançados em
computadores, identifica-se onde há fartura de produção e carência de produção.
Locais com maiores e menores consumos. Calcula-se a produção, a transformação, o
consumo e a armazenagem. Quanto se produziu, e quanto se consumiu; quanto foi importado
e o quanto foi exportado. Fatos importantes para serem utilizados em bolsas de
mercadorias com cotações internacionais.
Quem controla os satélites,
controla insumos e controla as maquinas. Sabe de tudo e nós não sabemos nada. Eles
controlam tudo e nós não controlamos nada. Exigem produção com qualidades e
quantidades, por eles determinadas. Exigem o melhor, para dentre as melhores
produções, a melhor parte ser exportada. Exportamos tudo de bom e de melhor, e
ficamos sem nada.
Natal/RN
em 28/03/15
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Agricultura otimizada II.
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